Do giz à literatura terapêutica: conheça a história da aposentada Dirce
A ex-professora, atualmente, é terapeuta e escritora, e publicou um livro sobre contação de histórias

Texto: Daniel Nogueira Vargas
- Foto: Divulgação
A vida da aposentada Maria Dirce Barcelos Silva é um verdadeiro baú de histórias e contação. Não à toa prefere ser chamada apenas por seu segundo nome, Dirce, uma espécie de personagem para a terapeuta e escritora que se tornou.
A ex-professora da Prefeitura da Serra lançou no ano passado seu primeiro livro: ‘A contação de histórias como ferramenta de identificação no processo terapêutico infanto-juvenil’. Além de sua busca incessante por conhecimento, os filhos Marcela e Lázaro foram fundamentais para a publicação dessa obra.
Marcela, pode-se dizer, que foi a “culpada” direta. Ela que entrou em contato com a editora para fazer publicidade dos textos de Dirce.
“Eu não tinha a pretensão de ser escritora. Sempre me achei perfeccionista ministrando aulas e palestras, mas nunca boa o suficiente para lançar livros. Também me sentia, de certa forma, frágil, devido ao câncer de mama que tratei de 2019 a 2024. Depois da minha experiência com a finitude, senti-me mais livre, perdi o medo e resolvi publicar a obra”, disse a ex-professora.
Liberdade que estava meio “adormecida”, mas presente no inconsciente de Dirce. Nascida em Vitória/ES, filha de um encarregado de linha e uma professora, exímios contadores de histórias, sempre passava férias com os avós Nila e João, no distrito de Calogi, na Serra.
“A contação sempre fez parte da minha vida. Meu pai Adionor contava estórias de pescadores e assombração; vovó e minha mãe Eleta davam aulas em Calogi, ou seja, eram mestras da contação; e meu avô era lavrador, pescador, contador de feijão e de ‘causo’”, lembrou a aposentada, moradora do bairro Valparaíso.
Dirce, então, transmitiu essa arte a seus filhos Marcela, Lucas e Lázaro. Por meio do último, nasceu Lorenzo, que é autista com altas habilidades e possui Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade. O laudo de seu neto só seria fechado com três anos de idade. Durante esse tempo, Dirce não parou de estudar, mesmo fazendo tratamento.
“Busquei entender melhor meu neto para orientar outras pessoas. Ele é um presente na minha vida. Minha maior diversão é contar histórias para ele. Tanto que, no livro, há um capítulo só sobre o Lorenzo”, disse a ex-professora.
Um livro resultado de intensa dedicação. Ainda na ativa, Dirce fez Magistério, graduou-se em Pedagogia, fez pós-graduação em Docência do Ensino Superior e mestrado em Psicanálise. Depois que se aposentou, em 2020, completou ainda uma pós-graduação em Neuropsicopedagogia e uma licenciatura em Ciência das Religiões. Isso sem mencionar os vários cursos que fez na área de contação de histórias.
E, por falar em contação, a aposentada confessou que construiu a obra a partir das aulas que deu em uma faculdade. Durante as explicações, ela usava sempre estórias e vídeos para fazer metáforas e analogias.
“Eu levava máscaras, perucas e roupas, a fim de criar um ambiente de fantasia. Assim, os alunos se identificavam, ficavam à vontade e continuavam as estórias que eu contava por trás da minha personagem. Hoje, utilizo essa estratégia terapêutica em minhas consultas de psicanálise, principalmente, com crianças”, relatou.
Dirce diz-se sentir privilegiada por voltar a trabalhar com a mente humana. “É Freud em uma cabeceira e a Bíblia, na outra”. Ela combina essas inspirações com idas à praia e à igreja.
“Não inicio nem termino meu dia sem oração. O cheiro do mar também me faz muito bem. Foi, em uma dessas idas à praia, que produzi a primeira parte de um documentário. Ele já está, inclusive, filmado, e fala sobre a história do bairro Manguinhos e seus moradores mais antigos”, afirmou.
Indagada sobre a previsão de lançamento desse documentário e também de outros três livros, que confessou estarem prontos, Dirce preferiu fazer suspense. Ela acredita que sairão na hora certa e que curtir essas atividades a ajuda em sua qualidade de vida.
“É levantar e ter um compromisso com você. A aposentadoria não é um fim, mas o começo de um novo ciclo. É como tecer uma tapeçaria sem terminá-la, para que outras gerações continuem da forma delas”, filosofou.
Seguindo esse raciocínio, ela considera fundamental que o IPS tenha iniciativas como a série ‘Beneficiário em Destaque’, para combater o preconceito.
“Muitos falam que o aposentado não serve para nada ou que só serve para cuidar de neto, de casa ou para bancar alguém com seu benefício. Essa é uma visão ocidental. No Oriente, somos vistos como sábios, como pessoas que têm muita experiência para transmitir aos outros”, destacou.
Por essa razão, a terapeuta e escritora alerta sobre a busca que os servidores precisam ter ao se aposentarem.
“Por experiência própria, digo que o aposentado pode se sentir despersonalizado. O que ele necessita é fazer um resgate de quem ele é. Antes, eu era uma professora, mas nunca fui só isso, entende? Ou seja, o aposentado precisa deixar emergir, florescer o seu eu. Não é porque uma árvore é antiga, que não dará mais frutos”, comentou.
E você, é aposentado da Serra e tem algum projeto de vida bacana? Participe das matérias da série ‘Beneficiário Em Destaque’.
Basta entrar em contato com o Serviço Social do IPS, por meio do telefone 3089-4800. O setor organizará as informações daqueles que implementaram novas formas de viver a aposentadoria e irá encaminhá-las para a Unidade de Comunicação do Instituto.
As matérias poderão abordar: projetos de desenvolvimento pessoal; lazer e saúde; financeiros; desenvolvimento da espiritualidade e outros.
Ao fim de cada ano, a autarquia reunirá todos esses protagonistas em um encontro especial, no qual poderão compartilhar experiências e sensações que tiveram com a iniciativa.